segunda-feira, 21 de maio de 2007

PEDAGIO

A abertura e a busca por um caminho comum, vem quando você está aberto ao outro. Minha casa sempre foi aberta, não precisando permissão para entrar. A porta não se trancava, correndo o risco de se encontrar sozinho na casa, com tudo disponível a quem chegasse. Típico de casa de interior. As pessoas não se guardavam das outras, estavam sim abertas para as novidades de transformações vindas de outros centros mais evoluídos. Minha casa tinha o apelido de hotel do sossego, pois hospedou vários amigos, que vinham matar a saudade da terra natal, trazendo novidades, rememorando o passado. Servindo de transição neste emigrar forçado em busca de vida melhor.
No meu jeito mineiro nunca precisei colocar em negritos ate onde o outro poderia chegar. Sempre tive consciência ou intuição de que, não se é atingido, se o que vem, não tem relação direta com o que se é. Mais tarde essa posição se estabeleceu com a mudança para minha rua, de meu pretinho, que já vinha cultivando amizades a muito.
na minha casa continuou essa abertura. as portas agora bem trancadas, pois os tempos e o lugar são outros. porem sempre com amigos e ate futuros amigos. gostamos de receber pessoas com outros horizontes,com expectativas puras,com sonhos, sim pessoas que sonham. Não digo sonhos materiais mas sonhos autênticos, que podem ser loucos ou não.
Neste ponto houve uma união entre o outro e a outra. Bom o outro acabei de falar, agora a outra posso dizer que e uma paixão: a bicicleta. Veículo bípede de alma: com o chão como suporte para elevar o homem ao céu . Quem já andou de bicicleta sabe disso, agora quem já viajou, só estes entendem de sua companhia, nos entraves trocados entre o homem e a máquina, fica a certeza de que ela é companheira pra qualquer aventura, criando ali uma cumplicidade de corpo e alma.
Em minha casa já se hospedaram vários ciclistas que tendo Brasília como meta ou estando aqui de passagem , em busca de sonhos,, querendo se encontrar ou apenas para aplacar a dor da alma nos brindaram com homens sem sua persona usual .
Tivemos Valmir do rio,que por duas vezes veio a câmara protestar voltando depois sem bicicleta apenas de visita, seu Nilo de Santos que com seus setenta e tantos veio lutar por uma aposentadoria melhor, nos deixando a lembrança de seus olhos infantis . Cleverson que atravessou a Amazônia com o retrato da família como escolta, Cremogema ciclista de Petrópolis que dizia aguentar tudo aquilo porque de manhã tomava seu mingau de cremogema, artista plástico do Paraná que nos deixou um mobile, que ate hoje balança no quintal, Ronildo que tentando fugir da rotina paulistana nos deixou uma bússula para melhor nos orientarmos. O ciclista de São Gonçalo que gostava de um conhaque, o argentino Adrian que foi tão especial com seu violão e gaita, que nos brindava a tarde com um blues, nos colocou todos a cata de uma erva mate do Paraguai, que adorava pão de queijo e guaraná e nos ofereceu o seu pastel feito na cozinha da Bizé, que veio de Ushuaia indo em direção ao Alasca,viagem interrompida pela doença do pai quando se encontrava na Venezuela, estando hoje em Ushuaia estudando turismo. Hoje estamos aqui com um novo hospede, que de inicio nos pareceu mais um doido e que a cada dia nos mostra a cara de uma juventude avida de bem. Lucca com seus vinte anos criou para si um propósito digno de um grande homem: conhecer a sua terra . Com a inteligência e a educação, que a mim parece de uma criança criada com direção ampla da vida , que nos surpreendeu com tanta objetividade. Brilho nos olhos e convicçao no que faz. E estamos aqui, se voce quizer participar e bem vindo . se quizer ajudar mais ainda.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

MANINHA

Novamente no passado... Patos de Minas, minha cidade natal, com um acontecimento anual marcante até nos dias de hoje: a Festa do Milho.
Na festa havia de tudo: rodeios, esquadrilha da fumaça, shows com vários cantores. A Festa do Milho marcou a todos. Havia o concurso de rainha do milho, criando grupos adversários como na política. Com carros alegóricos,bem enfeitados com as candidatas em cima, caracterizadas. A rainha, como num conto de fadas. Eu tive uma professora no segundo ano primário que ja havia sido rainha do milho. Eu passava a aula a admirá-la. Pra mim, ela era linda. O desfile era o ponto alto, com os colégios competindo entre si e ao mesmo tempo unindo todos nas confecções dos trajes típicos com palha de milho, milho, pipoca, e tudo que se relacionava com o tema. Acompanhava por mêses a confecção de chapéus e vestidos longos cobertos com grãos de milho, pregados um por um com agulha e linha. Os colégios começavam a se preparar meses antes. A fanfarra, ensaiava todo dia. Todos subiam para assistir o desfile. Todos de roupa nova, que era comprada para a ocasião. Em uma dessas festas, ganhei um balão com gás hélio. Quis preservá-lo, deixando-o no forro do meu quarto. No outro dia me deparei com o balão murchinho, coisa de criança...
Também ganhei um vestido e também um sapato novo. Que cuidava com todo zelo, pois naquela época, roupa nova era coisa de realização plena. Então minha prima Lazinha foi me levar ao show do Roberto Carlos, de quem eu era fã incondicional. Antes do show me dei a imaginar em como seria. Imaginei que ele saberia que ali na plateia havia uma garota que sabia todas as suas músicas e que ele até me convidaria para cantar com ele. Cheguei até a ensaiar. Fui para o show como quem vai para o céu... Porém, quando chegamos, o campo de futebol estava todo tomado de pessoas. Havia chovido, tudo era só lama. Custamos a entrar. Ficamos fora do alambrado. E ouvia a voz de meu ídolo bem longe, cheia de ruídos. Vi apenas seu vulto, longe em um palco no meio do gramado. Criando uma situação mais de sobrevivência do que de diversão. Fui embora decepcionada e bem amassada, ficando ali meus sonhos e também meu pé de sapato novo, que no outro dia, fui procurar sem encontrar, me causando grande tristeza ao olhar para um pé novinho, sem saber onde o outro estava. Até hoje queria encontrá-lo. Como se isso fosse resolver aquela minha perda... É, a gente as vezes pensa que vai recuperar o tempo perdido...
Então estou no presente, no meio da tarde me preparando para a noite assistir ao meu Chico Buarque, na companhia de minha filha mais velha, que me superou no favoritismo pelo Chico, de seu esposo e do meu pretinho,companhia fundamental nesta minha peregrinaçao chiquiniana, porque quem como eu, já o experimentou tanto e tantas vezes, sabe que ele já incorporou na minha alma. Sabe também que o tenho como meu, e que não importo que ele seja de outros, pois sei da sua grandeza. E o fato de ir ao seu show imaginando coisas, com o coração palpitantado desejos, só me faz ver a criança que ainda há em mim. Criança que se decepcionou com um sonho impossível e que agora espera estar preparada para o que na noite vai vir.

domingo, 13 de maio de 2007

AUTOFALANTES

Julio, meu irmão, companheiro de todas as brincadeiras na infância. Franzino e esperto.
No clube companheiro na natação e volei. No início eu me sobressaía, mas não tardou a me mostrar o quanto era superior. Às vezes fico tentando desvendar outros caminhos que ele seguiu e eu não participei, por que a gente estava sempre junto.
Era apontado por todos como o gênio da família e da rua. Desde muito cedo consertava os eletrônicos, fazia as instalações elétricas das casas que meu pai construia, passou na UnB sem fazer cursinho, montou seu som equalizado e equipou uma discoteca em casa, onde faziamos sons aos sábados depois de bem encerar os tacos e jogar bastante talco, adorava música, fã de kraftwert, caetano e miltom.
A vida nos dá espaços e em algum ponto me vi diante de suas próprias convicções, uma característica sua era a capacidade de chegar ao extremo de tudo. Seu bolo de chocolate feito num ritual de preparo sobre os olhos dos sobrinhos é lembrado até hoje. Que delícia!
Na Universidade se declarou homossexual. Não com palavras, porque ele nunca falou sobre isso com ninguém que eu tenha conhecimento. Não sobre ele. Falava sim do homem em potencial. A sua posição me intrigou muito. É incrível como a gente diante de certas coisas não consegue encontrar o coeficiente comum. A família engoliu aquilo sem digerir, e creio que eu também porque nos padrões de comportamento absorvidos por mim na época não me cabia entendimento.
Se uma pessoa não transa, ela é santa. Se esconde o que faz, é séria. Se ela vai pelo caminho que deseja, então a rotulam.
Aprendeu também a obter o prazer artificialmente. Das drogas ao Rock'n roll rolou de tudo.
Na sua busca solitária ganhou ritmo numa escalada mortal, experimentando todos os conceitos que a vida lhe apresentou.
Dançou nu na frente de nossa casa, indo dormir na prisão em companhia de um livro -Reich, levado por Robson;
Hoje acho que sei da muralha que ele ultrapassou e o quanto se sentiu sozinho do outro lado. Sei de sua coragem, sei da nudez que ele nos apresentou. O rei estava nu. Nu de todas as convenções que quiseram lhe impor.
Só sei que seu caminho foi traçado, e encerrado por ele mesmo. Na sua partida deixou belos poemas sobre Brasília e sobre si, barbeou-se. Na sua despedida, ficou o emblema do sem jeito. Pessoas iam ver e constatar o fato estampado em seu pescoço, que cobri com flores e desamarrei suas mãos. Vejam pois um pássaro com mãos atadas. O que diria Deus?
Sonhei sonhos horríveis com ele, amanhecendo em claro. Porém um dia, um sonho lindo, e último. Acredito que encontrou seu caminho naquele dia.

quinta-feira, 10 de maio de 2007

OURO PRETO

De volta ao passado recordo minha rua. Que não pode ser retratada sem a menção da rua perpendicular que a cortava.
Em minha rua, famílias estáveis em que pai, mãe, filhos trilhavam caminhos já percorridos por outras gerações.
Na perpendicular, havia uma rua, na qual funcionava a zona - lugar que me inquietava. Existia um ar de mistério, por que ninguém falava a respeito. Fui tomando um conhecimento particular de sua função. Nunca tive a visão do interior dessas casas. Casas com homens no portão, bicicletas estacionadas, músicas apelativas.
Me lembro bem daquelas mulheres que passavam em charretes belas, parecendo carruagens, com seus longos coques, belos vestidos, sapatos altos, sempre perfumadas, passeando pelas ruas. Quando passavam, deixavam alguma coisa no ar, que eu não entendia o que era.
Até quando me lembro, aquilo já não estava em seu auge. Auge que teve até a interferência da igreja e suas beatas. Segundo me contaram, o padre, em procissão com as mulheres, quebraram as casas.escomungando a todos. Mas debaixo dos panos, o negócio ía de vento em polpa. Em declínio, mas funcionando.
Mais tarde, quando apenas algumas casas restaram, tive contato com famílias que tinham filhos bastardos de mulheres recolhidas por homens, para formarem suas famílias. Filhos esses apontados por todos como ilegítimos e despreferidos pelos pais.
Então tive contato com uma dessas casas. Era uma casa, com uma grande sala que dava entrada para um corredor, com quartos alinhados. Cada quarto tinha uma cama de casal, uma penteadeira e um banheiro. Brincávamos pulando nos seus colchões de mola. E eu alí, com poucos anos, tentando entender seu passado velado, que não deixou de me influenciar.
É fato que todos os homens de minha rua freqüentavam ou freqüentaram aquelas casas.
Meu pai, em particular, as freqüentou. Da sua pinga no final da tarde, no boteco da esquina, com desaparecimento abrupto, diante dos meus olhos vigilantes.
Sim, havia aquele buraco negro que engolia os homens e os devolviam sorridentes para suas famílias.
Então, faço a comparação. Me pergunto, se era melhor ou pior que agora. Em que aquela concretude familiar passou a ser bastante maleável, em que, essas mulheres, no seio familiar, são como camaleões, se mesclando no cotidiano vazio de definições.

MOTO-CONTINUO

É mais forte que eu... não, a verdade é que eu sou mais forte que isto. Então tenho repulchões de mim sobre mim. Luta interna, num reboliço de posição. Um querendo ir outro querendo ficar. A quem ouvir? As vozes se mesclam. Um está para o outro, o outro esta para um. E o dominante sabe que "eu", sei das grades que me cercam. Sei do calibre que me detem... merda.

terça-feira, 8 de maio de 2007

AUTENTICIDADE

Se escrevo sobre mim tão claramente e com tanta insistência é porque quero dizer a todos que tento entender a vida. Quero dizer que se fico calada é porque me falta entendimento ou assunto. Se me sinto feliz é porque realmente me sinto feliz ou não. Se me agridem quero reagir. Por isso não vamos fazer vista grossa e nem tapar o sol com a peneira.
Ah, se pudesse contar por um instante o que meu coração carrega... Na vida existe um caminho natural e um caminho que as pessoas buscam como o ideal, o futuro garantido com as verdinhas brilhando.
Eu tentei ler entre os segundos o que o dia pedia a meu coraçao. E vejam "paguei o preço" não restando nada além de mim mesmo pra agir e reagir. Isso é entrega, comprometimento. Quem neste mundo de tantos caminhos fáceis preferiu subir a ladeira? E grito que estou onde lutei pra estar. E digo que não foi nada fácil. E se alguém que não pagou o preço, que foi pelo caminho mais fácil que quer pousar de disco voador, que quer fazer do meu caminho difícil, agora facil, o seu caminho oportuno, diante de sua desgraça pessoal. Quer chegar de salto alto onde andei descalço e dançar o seu happy day. Pois abro meu caminho pra você. Mas não sei se vai lhe ser útil, porque dos degraus que subi um levou ao outro numa longa jornada. E você com seu sapato alto pode cair tentando subir todos de uma vez se estatelando no seu orgulho. Seu caminho você escolheu e ele pode levar a você que anda tão perdido no seu jogo de interesses. Colha seus frutos.